Sonhei muito com esse dia. Do último título do São Paulo, o meu amado Tricolor, até ontem, foram 3.456 dias de espera, como trouxe a Folha de Londrina. Completaríamos nove anos na fila ao final da temporada, caso passássemos em branco 2021 também. O troféu que veio foi o do Paulista, tido como o menos importante dos que o São Paulo disputa. Muito se fala sobre a relevância dessa conquista, mas veja a festa da torcida, o desabafo, o choro do Muricy – de volta ao clube e que, obviamente sem ser coincidência, acabou em título -, a satisfação do já grande técnico Crespo na sua coletiva, a fala do maior campeão da história do futebol, Daniel Alves, que veio ao São Paulo realizar o sonho de menino, decidindo-se por se tornar jogador profissional inspirado pela inesquecível geração tricolor dirigida por Telê Santana.
Esse título tem um peso imenso, e um sabor delicioso. Especialmente por reavivar a autoestima do torcedor são-paulino, fortemente abalada pelos anos de seca. O Palmeiras, rival derrotado de ontem, ganhou Libertadores, Copa do Brasil, Brasileiros anos atrás; o Corinthians idem aos últimos títulos, também o Paulista, como o alviverde no ano passado; o Santos também ergueu o troféu estadual anos atrás, e nós, são-paulinos, assistindo amargamente. Isso, falando de um clube que na segunda metade da primeira década do século foi avassalador, levando tudo – Paulista, Libertadores, Mundial, e três Brasileiros seguidos, feito que só o Tricolor fez no Brasil. Depois disso, só a Sul-Americana de 2012, em que eu estava presente no Morumbi, e nada mais. Só eliminações precoces, muitas vezes vergonhosas, para time infinitamente menores, e o rótulo de amarelão sendo inevitável.
Por todos esses quase nove anos, estive lá, sempre com meu companheiro de toda partida, meu avô Nei, que me levou para o bom caminho, em frente à TV – moro em Londrina (PR) e o momento do clube não contribuía para novas viagens para ver o Tricolor no estádio -, e muitas dessas vezes desapontado, triste, deprimido com os resultados negativos nas competições, e até nos jogos, em que em diversas ocasiões não via brio nos atletas, o que deixa qualquer torcedor apaixonado, “P” da vida. No fundo, o torcedor quer olhar para o seu time e vê-lo lutando, sentir-se representado em campo, já que não pode estar lá pra jogar. Quer que os jogadores honrem aquele manto sagrado – sim, para o torcedor, ele é! Mas claro, vitórias e títulos são necessários, e para nós, eles não vinham de jeito algum. Rondava uma teoria entre os são-paulinos de que os argentinos do Tigre, equipe derrotada pelo Tricolor na final da Sul-Americana 2012 e que não voltou para o segundo tempo, enterraram alguma mandinga no Morumbi para impedir novos títulos do dono da casa.
Se isso ocorreu, ontem desenterramos – sai, zica! – de forma louvável. Enfim, vemos a combinação da representatividade esperada pelos torcedores, que já era vista no time do ano passado, ainda com Fernando Diniz no comando, e os acertos táticos, a pegada e competitividade dignas de um argentino que hoje é o técnico tricolor. No dia 1º de março escrevi um post neste blog criticando a postura dos jogadores, que já era um câncer na equipe, que se acomodava facilmente quando saía à frente nos placares, para exemplificar a psique são-paulina, e a longo prazo não alcançava as conquistas. Estávamos fartos de ter bons times, que sempre tivemos, de ter uma história gigante e inquestionável, de animar com bons começos mas, na hora do vamos ver, afrouxava-se. Esse não era o nosso São Paulo, algo estava errado, e era no seu âmago, nos seus corredores, na sua mentalidade.
Tenho a crença de que esse longo jejum – e só os são-paulinos conhecem o seu tamanho – veio de ensinamento, realmente. Após as pesadíssimas conquistas já citadas, o clube se acomodou e parou no tempo, enquanto os demais avançaram. Eu, na minha inocência de adolescente da época, achava que seríamos sempre campeões. Anos depois, vi que não, o futebol é mesmo cíclico, democrático, e hoje, mais do que nunca, extremamente competitivo.
Para erguer taças, um clube precisa ser muito profissional, ter gestão, um caixa minimamente sustentável, planejamento, foco, competência, e muita, muita vontade de vencer. Ou senão, voltará à fila, o que aumenta o anseio da torcida. E quando finalmente o jejum é quebrado, como o foi ontem, vem a explosão. Depois do segundo gol contra o Palmeiras, não contive as lágrimas, que contêm anos de espera pela glória. Eu e meu avô pudemos comemorar de novo, ser campeões de novo, assim como outros mais de 16 milhões de tricolores espalhados pelo Brasil e pelo mundo. Essa mobilização é fantástica, e só possível através do futebol. Uma paixão por uma instituição que representa tanta gente, movida pela arte, pela competitividade e pelo esporte da bola nos pés, promovedor de alegrias e emoções.
Se há alguém lendo esta crônica que não se liga ao futebol, digo que a relação de um torcedor com o clube é inerente à sua vida, ao que há nela de mais marcante. Quando eu mal aprendera a andar, já estava com o manto sagrado tricolor colocado pelo meu avô, dando meus primeiros chutes na bola. O primeiro título que me lembro é do Paulista de 1998, no retorno de Raí ao São Paulo, em cima do Corinthians. Tinha oito anos. Na minha adolescência, conquistamos a América e o mundo. Depois, três Campeonatos Brasileiros seguidos. Após o achado da Sul-Americana em 2012, amargura e melancolia. E o que nos sustentava? O amor, genuíno, sublime pelo meu time da infância, do coração. Não à toa digo que o futebol é uma paródia da vida: há muitos altos e baixos; por vezes os baixos parecem não cessar, falta esperança, mas algo o mantém ali, firme, e sendo guiado a torcer em qualquer jogo que fosse, após a eliminação que ocorrera na partida anterior. Importava estar ali.
Não serei pretensioso de descrever fielmente o que sentimos nesse momento, isso não se descreve. Só quero falar do meu amor, da minha alegria em ver o meu amado Tricolor no topo de novo, seja do Campeonato Paulista, mas com uma taça, e o nome de novo em evidência. Nós merecemos, o São Paulo merece, o Muricy merece, o Crespo, o Dani, o Miranda – monstro! -, o Hernanes, nossos capitães. A nossa molecada da base, de Cotia. Tanta gente merece, porque é por momentos assim que a gente vive, e são essas horas que todo torcedor espera, um gol à última potência, uma taça ao céu, o prêmio pela entrega, o choro da paixão, a vitória do gigante, a comoção de milhões. Futebol é inexplicável, o São Paulo é inexplicável, e oficialmente o parabenizo, meu Tricolor! Que seja o primeiro de muitos de uma nova era, porque o Tricolor, os clubes gigantes do nosso futebol, são para sempre. É campeão, p***!!!
