Fazer terapia há mais de 10 anos fez e faz total diferença na forma como vivo, desde então. Ao ser encaminhado às sessões, então com 20 anos, sofria com preconceitos dos quais hoje me pego rindo, do então menino Fábio, que à época se achava muito detentor de si mesmo. É este ponto que quero abordar – dentre tantos que a terapia contribuiu comigo: a minha posse de mim mesmo; o fato de estar consciente sobre as minhas ações, meus pensamentos e dificuldades, e a partir disso, tomar um novo rumo que me seja mais benéfico.
Vivemos uma vida que é recheada de aspectos como família, amizades, trabalho, lazer, namoro, casamento etc. Por mais que muitas das vezes as vivenciemos a partir do nosso próprio desejo – ou até por isso mesmo – é preciso olhar para tudo isso com muito zelo e carinho. “Quem ama, cuida” é o famoso ditado, mais que verdadeiro. Anteriormente alheio ao que se passava em minha vida, hoje vivo as situações com mais profundidade e verdade, seja ela boa ou má no momento em que acontece.
Aprendi que não é inteligente jogar as coisas para debaixo do tapete. Elas estarão lá, prontas para retornarem e possivelmente de forma mais dolorosa. Durante esse tempo também passei a observar as pessoas e ver que sim: a terapia cairia bem a todos nós. Pelo simples fato de que nascemos pelados não só no corpo, mas de sabedoria para lidar com muito do que nos acontece. Nossos pais nos ensinam a moralidade, os princípios, mas não têm a varinha de condão para prever cada percalço que está por nos esperar na virada da esquina. E principalmente, não têm conhecimento aprofundado sobre a mente e o comportamento humano, a não ser que sejam profissionais da área.
Nós já éramos imperfeitos, e o mundo foi se apresentando cada vez mais exigente e competitivo. Como resultado, mesmo antes aos tempos caóticos que vivemos hoje, víamos muitas pessoas em depressão e desencontradas de si. É aí que a terapia entra, e se bem feita e trabalhada, devolve o indivíduo a si mesmo, como no processo narrado pelo brilhante Fernando Pessoa, em seu poema “A criança que fui chora na estrada”:
“A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou…”
Uma das consequências da sintonia consigo mesmo é a maior aptidão para estabelecer prioridades. Não podemos fazer tudo, nem quando queremos. Muitas vezes, escolhemos algo, perdemos da mesma forma. Há momentos em que não há outra opção senão algum “prejuízo” pelo caminho, que se justificará mais à frente. Ao mergulhar na terapia, é este o processo que se estabelece, mesmo quando o paciente ainda nem sabe o que alcançará, mas se curva ao tempo e à resiliência para então poder enxergar bem mais além.
Vejo o momento que estamos vivendo da mesma forma, e lamento que muitos não vislumbrem nem dois metros adiante. A luta contra a Covid-19 é uma terapia coletiva, a hora de tomarmos nossas rédeas internas por algo absolutamente maior. E, se feito da maneira correta, levaria menos tempo até que um árduo processo de terapia para alcançarmos grandes vitórias. Não critico aqui, logicamente, os que são obrigados a ir às ruas, ao trabalho, pegar ônibus etc. Para estes, não há escolha. Mas não estamos na situação que estamos pelos que não têm opção.
Esta pandemia escancarou muita coisa, e uma delas é a discussão das prioridades – muito delicada, é verdade. O que percebo é que muitos não estão preparados para estabelecê-las, pois não sabem lidar com a abdicação, por menor que seja. Ou por piores os nossos prejuízos, eles se renovarão ao não nos conscientizarmos o quanto antes, como é levada às piores crises uma pessoa que reluta em ver em si aspectos que precisa trabalhar para viver melhor.
Estou chateado por novamente estar abordando a pandemia no blog, porém escrever também é como a terapia. Muitas vezes não queremos falar daquilo, mas é preciso, para o quanto antes não ser mais. A muita gente, como já ocorreu mais comigo, falta ver que o básico vale muito, principalmente quando é tão seriamente ameaçado. Que a inteligência de que dispomos nos guie para o que precisa ser feito, e construindo uma casa de concreto, e não de a palha – como se diz em terapia -, possamos aos poucos merecer mais normalidade.

Fabio, terapia é uma forma única de se enxergar, de se aceitar e se amar. Muito importante num mundo tão confuso como o de hoje.
Parabéns pelo texto!
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Disse tudo, Nanci! É uma experiência que todos deveriam viver, né?!
Obrigado demais sua leitura de sempre e comentário! =))
Beijo grande, Nanci!!
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Oi Fábio, eu até troquei mensagens com a Sílvia exaltando a sua coragem neste texto e naquele que você retrata a sua relação com a bebida . Não é fácil se expor assim para todos , porque a terapia ainda é vista com desdém para alguns . Ganhamos todos os leitores, principalmente os que se identificam com os textos . Abraço
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Fala, Rui! Pois é, coisa que precisa ficar pra trás.. a terapia é um instrumento de autoconhecimento impressionante, e por isso escrevo sobre ela, para ajudar a desmistificar um pouquinho mais, né?!
E sem dúvidas tem muita relação com a escrita, na exposição, enfrentamento e assimilação de todo o necessário.
Valeu garoto, abração pra você!!
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A claridade dos teus pensamentos expostas nos seus textos são reflexo desse coração escancarado que você tem, Fabinho! Orgulho de fazer morada também nesse coração.
Parabéns por mais um texto necessário, meu amor.
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Ô meu amor, assim você me mata, hehehe.. que alegria receber esse seu amor e seu reconhecimento. Obrigado por tudo, certamente tem um pouco de todas as nossas conversas aí. Amo você!
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